CPI das Pirâmides Financeiras aprova relatório que pede indiciamento de executivos da 123 Milhas, Ronaldinho Gaúcho e mais 36
CPI das Pirâmides Financeiras aprova relatório que pede indiciamento de executivos da 123 Milhas, Ronaldinho Gaúcho e mais 36
Deputado Ricardo Silva protocolou parecer de mais de 500 páginas. Documento também aponta crimes supostamente cometidos pelo 'Faraó das Bitcoins’.
Por Elisa Clavery, Luiz Felipe Barbiéri, Zileide Silva, TV Globo e g1 — Brasília
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras aprovou nesta segunda-feira (9) o parecer do deputado Ricardo Silva (PSD-SP), com mais de 500 páginas, que sugere o indiciamento de 45 pessoas – entre elas, oito pessoas ligadas à 123 Milhas, empresa que em agosto suspendeu a emissão de bilhetes de viagens que já tinham sido pagos pelos clientes.
Segundo o
relatório, as oito pessoas ligadas à 123 Milhas devem ser investigadas a crimes
como:
estelionato;
gestão
fraudulenta;
pertinência
à organização criminosa;
lavagem de
bens e capitais
crime contra
as relações de consumo por fraudar preços ao induzir o consumidor a erro;
crime contra
a economia popular, por obtenção de ganhos ilícitos em detrimento de grupo de
pessoas por meio de especulações ou processos fraudulentos.
O parecer
aponta fatos que indicam que os sócios das 123 Milhas, “já cientes da derrocada
da empresa, executaram estratégias para desviar ativos dela para si e para seus
parentes”. Além disso, o relatório afirma que “chamam atenção os diversos
empréstimos que a 123 Milhas contraiu” e que os sócios “já falseavam as demonstrações
financeiras da empresa”.
Como mostrou
o Jornal Nacional na semana passada, a CPI investigou a empresa com auxílio da
Polícia Federal. As investigações mostram que a empresa 123 Milhas operava no
vermelho quatro anos antes de pedir recuperação judicial.
O relatório
da Polícia Federal mostrou que a 123 Milhas vendia “hoje” para pagar “amanhã”,
apostando em preços que não estavam sob o seu arbítrio e escolha. Ainda segundo
o relator, a empresa vendia viagens para dois ou três anos à frente, datas em
que as companhias aéreas sequer haviam começado a oferecer passagens.
No parecer
protocolado nesta segunda, o relator descreve que, a partir de 2022, a 123
Milhas passou a oferecer um produto chamado “Linha Promo”, ou seja, a venda de
promessas de emissão de passagens por um preço “significativamente inferior aos
normalmente encontrados nos sítios eletrônicos de companhias aéreas”.
Em 2023,
contudo, a 123 Milhas informou que não poderia emitir as passagens como havia
prometido aos clientes, já que sua operação havia se tornado
“deficitária” e “insustentável por razões imprevisíveis.
O parecer,
contudo, afirma que essa versão não corresponde aos fatos e que há indícios de
“intenção dos sócios de falsear os resultados da empresa”. Um deles seria o
fato de que a 123 Milhas ter sido o maior anunciante do Brasil em 2021 e o
segundo maior em 2022. Porém, o volume de gastos com publicidade foi
contabilizado como ativos, não como despesas.
“A
contabilização de todos esses gastos com marketing como ativos permitiu que a
empresa apurasse lucro quando, na verdade, deveria ter registrado prejuízo.”
A CPI
aponta, ainda, que a empresa contratada para administrar as verbas de marketing
tinha entre seus sócios o pai de um dos sócios da 123 Milhas.
“A
manipulação de resultados contábeis, a distribuição de dividendos em uma
empresa em condição periclitante, a realização de transações com partes
relacionadas (como aquela realizada com uma empresa controlada pelo pai dos
sócios) em condições duvidosas são alguns dos diversos indícios de que os
sócios da 123 Milhas seguiram uma estratégia para assegurar o aumento do seu
patrimônio pessoal/familiar diante da iminente quebra da empresa que
administravam”, diz o parecer.
Faraó dos Bitcoins
A CPI também sugere o indiciamento de Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como o “Faraó dos Bitcoins”, por crimes como estelionato, lavagem de bens e capitais, gestão fraudulenta, operação de instituição financeira sem autorização e crime de pertinência à organização criminosa.
Glaidson foi
preso em agosto de 2021, acusado de liderar um esquema financeiro que
movimentou cerca de R$ 38 bilhões e lesou milhares de investidores em
criptomoedas, as moedas virtuais. Ele também é denunciado pelo Ministério
Público por montar um aparato para tirar a vida de quem ousava ser seu
concorrente no mercado de criptomoedas.
Outros indiciamentos
Além dos
indiciamentos ligados à 123 Milhas, o relator também propõe investigações para
outros casos de pirâmides financeiras. Entre elas, a de pessoas envolvidas na
empresa 18KRonaldinho — como o ex-jogador Ronaldinho Gaúcho e do seu irmão,
Roberto de Assis Moreira. Para os dois, foram apontadas suspeitas de crimes
como estelionato, lavagem de bens e capitais, gestão fraudulenta e operação de
instituição financeira sem autorização.
Em nota, a
defesa de Ronaldinho afirmou que “inexiste qualquer mínimo indício de
prova de qualquer ilícito”.
“A CPI
sequer se preocupou em ouvir os proprietários da empresa. Trata-se de tentativa
de ganhar os holofotes através de nomes de personalidades”, completou a
nota.
Ao prestar
depoimento à CPI, no fim de agosto, o ex-jogador disse não ser proprietário,
nem sócio da empresa.
“Os
sócios de tal empresa são os senhores Raphael Horácio Nunes de Oliveira e
Marcelo Lara Marcelino. Eles utilizaram indevidamente o meu nome para criar a
razão social desta empresa. Jamais participei da empresa”, disse
Ronaldinho na ocasião.
O parecer
afirma ser “indefensável” a tese de que ambos não sabiam que a empresa fazia parte
de um esquema fraudulento.
“A
imagem do ex-jogador dá nome à empresa e estampa diversas propagandas da
18kRonaldinho, ligadas à divulgação de investimentos com criptomoedas com lucro
de 2% ao dia e 400% de rentabilidade”, afirma.
De acordo
com o relatório, a empresa 18kRonaldinho/18kWatches seria um “esquema criminoso
de captação de vítimas para obtenção de vantagens ilícitas, através de
promessas irreais de alta rentabilidade”. O parecer diz, ainda, que a empresa
negociava criptoativos e “foi operada de forma fraudulenta e sem autorização
das autoridades competentes.”
Relatórios
do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), aos quais a CPI teve
acesso, apontam ainda “indícios de ocultação e dissimulação da natureza e
origem de valores” de pessoas envolvidas no caso, o que pode estar relacionado
aos altos ganhos da empresa.
O parece
também sugere o indiciamento de pessoas ligadas aos casos envolvendo as
empresas:
Gas
Consultoria;
Ows;
Braiscompany
MSK
Investimentos;
Rental Coins
RCX Group
Investimentos;
Grow Up;
Atlas
Quantum;
Indeal
Consultoria;
Trust Investing;
Binance.
Recomendações
O relatório
traz uma série de recomendações para órgãos na esfera administrativa, como o
Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários, a Secretaria Nacional do
Consumidor, entre outros.
Entre as
sugestões, está uma que propõe à Receita Federal do Brasil atualizar o conceito
de criptoativo e ampliar o dever de reportar operações pelos representantes
locais das corretoras estrangeiras.
O texto
também pede uma auditoria fiscal especial de 28 empresas em razão de
irregularidades identificadas durante os trabalhos da CPI e que podem
configurar crimes contra a ordem tributária.
Ao Banco
Central é recomendado a apuração da conduta de Prestadores de Serviço de Ativos
Virtuais (PSAVs), quando estes fazem uso de configurações de operação de
depósito e saques em reais através de contas bancárias que não são de
titularidade dos prestadores.
Além disso,
o relatório propõe quatro projetos de lei para aprimorar:
– a
legislação penal em relação à obtenção de ganhos ilícitos através de processos
fraudulentos;
– a
legislação em relação a prestadores de serviços de ativos virtuais
– a
legislação em relação à publicidade de cripto ativos por influenciadores
digitais;
– a
legislação em relação aos programas de milhagem de empresas do setor aéreo.