Discurso de Lula no Brics inclui apelos contra mudança climática, crítica às guerras e defesa da taxação dos ‘super-ricos’
Discurso de Lula no Brics inclui apelos contra mudança climática, crítica às guerras e defesa da taxação dos 'super-ricos'
Presidente participou de encontro por videoconferência, quatro dias após sofrer queda e cancelar viagem à Rússia. Em 2025, Brasil vai ocupar a presidência rotativa do grupo de países.
Por Guilherme Mazui, Mateus Rodrigues, g1 — Brasília
O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva participou nesta quarta-feira (23), por
videoconferência, da reunião presidencial da Cúpula do Brics em Kazan, na
Rússia.
Lula iria
presencialmente ao evento, mas teve de cancelar a viagem internacional no
último sábado (19), após cair no banheiro do Palácio da Alvorada, bater a nuca
e precisar levar cinco pontos no ferimento.
O presidente
brasileiro fez um discurso curto, de pouco mais de 7 minutos. Foi antecedido
pelo presidente do Egito, Abdul Fatah Khalil Al-Sisi, e seguido pelo presidente
da Etiópia, Taye Atske Seto.
A reunião
foi coordenada pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, que está no comando
rotativo do bloco. Em 2025, esse comando será ocupado pelo Brasil.
No discurso, Lula recorreu a temas frequentes nas suas últimas participações em fóruns internacionais, incluindo (clique para ir ao trecho):
apelos
contra a mudança climática;
defesa da
taxação dos “super-ricos” e do combate à fome;
crítica às
guerras no Oriente Médio e no Leste da Europa;
pedidos por
democratização do acesso às vacinas e à inteligência artificial;
defesa da
criação de uma “moeda comum” para transações entre países do Brics –
que, assim, não precisariam usar o dólar para fazer comércio uns com os outros.
Mudança
climática
Lula afirmou
que o Brics é um “ator incontornável” para cumprir as metas globais
do Acordo de Paris, que incluem limitar a elevação da temperatura média global
a, no máximo, 1,5 ºC em relação aos níveis pré-industriais.
ONU:
metas do Acordo de Paris já são insuficientes
“Não há
dúvida de que a maior responsabilidade recai sobre os países ricos, cujo
histórico de emissões culminou na crise climática que nos aflige hoje. É
preciso ir além dos 100 bilhões [de dólares] anuais prometidos e não cumpridos.
E fortalecer medidas de monitoramento dos compromissos assumidos”, cobrou.
“Os
dados da ciência exprimem um sentido de urgência sem precedentes. O planeta é
um só, e seu futuro depende da ação coletiva. Também cabe aos países emergentes
fazer sua parte”, disse Lula, lembrando que o Brasil sediará a Cúpula do
Clima (COP) de 2025, em Belém (PA).
‘Brics é
“ator incontornável” no enfrentamento da mudança do clima’, diz Lula
durante reunião da Cúpula do Brics
Taxação
dos super-ricos e combate à fome
Lula
aproveitou o discurso no Brics para “divulgar” a pauta defendida pelo
país à frente do G20 – grupo que reúne as principais economias do planeta.
O Brasil, na
presidência rotativa do G20, colocou ênfase em temas como a taxação das grandes
fortunas mundo afora e a criação de uma “aliança global” para acabar
com a fome.
“Quero
agradecer o apoio que os membros do grupo têm estendido à presidência
brasileira do G20. Seu respaldo foi fundamental para avançar em iniciativas que
são fundamentais para a redução das desigualdades, como a taxação dos
super-ricos. Nossos países implementaram nas últimas décadas políticas sociais
exitosas, que podem servir de exemplo para o resto do mundo.”
Número de
super-ricos dispara, e é preciso fortuna cada vez maior para se tornar um
‘ultrarrico’, diz Fortune
“A
Aliança Global contra a Fome e a Pobreza já está em fase avançada de adesões.
Convido todos a se somarem à iniciativa que nasceu no G20, mas está aberta a
outros participantes”, disse.
Guerras
no Oriente Médio e no Leste Europeu
Lula voltou
a criticar a resposta militar de Israel contra o Hamas e o Hezbollah e afirmou
que é “crucial” iniciar negociações de paz.
Diante do
presidente da Rússia, Vladimir Putin, Lula mencionou o “conflito entre
Ucrânia e Rússia”, mas não condenou a invasão de forma enfática – como
fez, por exemplo, ao chamar a Faixa de Gaza de “maior cemitério de
crianças e mulheres do mundo”.
“Como
disse o presidente Erdogan na Assembleia Geral da ONU, Gaza se tornou o maior
cemitério de crianças e mulheres do mundo. Essa insensatez agora se alastra
para Cisjordânia e para o Líbano. Evitar uma escalada e iniciar negociações de
paz também é crucial no conflito entre Ucrânia e Rússia”, declarou.
Lula ainda
informou que a presidência do Brasil no Brics, ao longo de 2025, terá como lema
“fortalecer a cooperação do Sul Global para uma governança mais inclusiva
e sustentável”.
Vacinas e
inteligência artificial
Lula afirmou
que, durante a presidência brasileira do Brics, trabalhará para “reafirmar
a vocação do bloco na luta por um mundo multipolar e por relações menos
assimétricas entre os países”.
O presidente
defendeu ampliar o acesso de países mais pobres a tecnologias como vacinas e
inteligência artificial.
“Não
podemos aceitar a imposição de ‘apartheids’ no acesso a vacinas e medicamentos,
como ocorreu na pandemia, nem no desenvolvimento da inteligência artificial,
que caminha para tornar-se privilégio de poucos”, disse.
“Precisamos
fortalecer nossas capacidades tecnológicas e favorecer a adoção de marcos
multilaterais não excludentes, em que a voz dos governos prepondere sobre
interesses privados”, acrescentou.
‘Moeda
comum’ do Brics
Lula elogiou o trabalho do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), presidido atualmente por Dilma Rousseff, e destacou que é preciso discutir com “seriedade, cautela e solidez técnica” a criação de meios alternativos de pagamento para transações entre países do bloco.
“Agora
é chegada a hora de avançar na criação de meios de pagamento alternativos para
transações entre nossos países. Não se trata de substituir nossas moedas, mas é
preciso trabalhar para que a ordem multipolar que almejamos se reflita no
sistema financeiro internacional. Essa discussão precisa ser enfrentada com
seriedade, cautela e solidez técnica, mas não pode mais ser adiada”,
disse.
A medida visa substituir o dólar como moeda
padrão para essas transações entre nações. No dia a dia da população desses
países, a moeda local continuaria sendo usada – como o real no Brasil, por
exemplo.