Salário mínimo: nova regra pode tirar R$ 110 bilhões de pensões e aposentadorias até 2030; medida representa 1/3 do ajuste total

Salário mínimo: nova regra pode tirar R$ 110 bilhões de pensões e aposentadorias até 2030; medida representa 1/3 do ajuste total

Governo está propondo limitar o ritmo de crescimento do salário mínimo nos próximos anos, o que reduzirá o valor pago em aposentadorias, pensões e benefícios como o BPC.

Por Alexandro Martello, Lais Carregosa, Guilherme Mazui, Thiago Resende, g1 — Brasília

Aposentados, pensionistas e beneficiados por programas sociais vinculados ao salário mínimo (como o BPC) devem arcar com a maior parte do corte de gastos anunciado pelo governo federal.

O pacote divulgado nesta quinta-feira (28) pela área econômica ainda será enviado ao Congresso e precisa ser aprovado por Câmara e Senado para virar lei.

Pela proposta da equipe econômica, a nova regra que limita o crescimento do salário mínimo pode gerar uma economia de R$ 109,8 bilhões entre 2025 e 2030.

Isso equivale a um terço da expectativa total de economia de dinheiro público no período: R$ 327,1 bilhões.

Ou seja: para cada R$ 3 poupados com o pacote, R$ 1 seria sobre o pagamento de aposentadorias, pensões e benefícios sociais.

Atualmente, o salário mínimo está em R$ 1.412.

Em 2025, por exemplo, a projeção é de que o salário mínimo continue crescendo, mas que fique R$ 6 menor (R$ 1.515) com o novo formato.

Pela atual fórmula de correção do salário mínimo, que o governo busca alterar, o valor subiria para R$ 1.521.

 

Entenda a mudança

 

Pelo formato adotado atualmente, o reajuste do salário corresponde à soma de dois índices:

 

– a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) em 12 meses até novembro – como prevê a Constituição; cujo valor está estimado em 4,66% pelo governo.

– o índice de crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois anos anteriores. No caso de 2025, vale o PIB de 2023 — que cresceu 2,9%.

-a alta, nesse caso, seria de 7,71% a partir de janeiro de 2025, correspondente ao mínimo de R$ 1.521.

 

Com as mudanças propostas pelo governo, se aprovadas:

– as regras gerais listadas acima seguem valendo, mas serão limitadas em períodos de alto crescimento econômico;

– nesses momentos, o impacto da alta do PIB será de, no máximo, 2,5 pontos percentuais;

– a correção inflacionária segue garantida, qualquer que seja o ritmo da inflação.

Com isso, seria dada a inflação do ano anterior, em 12 meses até novembro, acrescido do PIB de dois anos antes — mas com um teto de 2,5% (mesmo que o PIB de dois anos antes tenha crescido mais do que isso).

Esses 2,5% são, justamente, o limite máximo para os gastos do governo dentro do arcabouço fiscal, a regra para as contas públicas aprovada em 2023.

 

Desse modo, em 2025, se a nova regra já estivesse aprovada:

– haveria um a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) em 12 meses até novembro – como prevê a Constituição; cujo valor está estimado em 4,66% pelo governo.

– mais a variação real do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois anos anteriores. No caso de 2025, vale o PIB de 2023.

– Mesmo o PIB tendo avançado 2,9% em 2023, com a nova trava de 2,5%, proposta pela equipe econômica, seria aplicado esse valor.

– O aumento, com a aprovação da nova fórmula, seria de 7,29%, para R$ 1.515 em 2025.

 

Despesa menor em 2025

Com a nova proposta para o salário mínimo, o governo deixará de pagar em aposentadorias e benefícios sociais cerca de R$ 2,2 bilhões em 2025.

Isso porque, de acordo com cálculos do governo, a cada R$ 1 de aumento do salário mínimo cria-se uma despesa de aproximadamente R$ 392 milhões.

Os benefícios previdenciários, entre outros, não podem ser menores que o valor do mínimo.

 

Veja a projeção de economia ano a ano:

 

2025: R$ 2,2 bilhões

2026: R$ 9,7 bilhões

2027: R$ 14,5 bilhões

2028: R$ 20,6 bilhões

2029: R$ 27,8 bilhões

2030: R$ 35 bilhões

 

Referência para 59,3 milhões de pessoas

De acordo com nota técnica divulgada em dezembro do ano passado, e atualizada em janeiro de 2024 pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário mínimo serve de referência para 59,3 milhões de pessoas no Brasil.

Além dos trabalhadores que, por contrato, recebem um salário mínimo (ou múltiplos do mínimo), há também as aposentadorias e benefícios como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) vinculados ao mesmo valor.

O salário mínimo também gera impactos indiretos na economia, como o aumento do “salário médio” dos brasileiros e a elevação do poder de compra do trabalhador.

 

Cortes de gastos

Com as propostas de cortes de gastos, incluindo a limitação do valor a ser pago no salário mínimo nos próximos anos, o governo busca conter gastos obrigatórios para tentar manter operante o arcabouço fiscal, a norma para as contas públicas.

A regra geral do arcabouço prevê que o aumento de algumas despesas do governo esteja atrelado ao crescimento das receitas. Além disso, a alta das despesas não pode ser maior do que 2,5% por ano acima da inflação.

Entretanto, alguns gastos têm regras específicas (distintas das do arcabouço) e, por isso, têm apresentado crescimento anual acima dos 2,5% limite para as despesas totais do governo. São eles:

 

– aposentadorias dos trabalhadores (vinculadas ao salário mínimo)

– despesas em saúde e educação

– emendas parlamentares (indexadas à arrecadação)

 

A lógica é que, sem o corte de gastos, o espaço para as despesas livres dos ministérios, conhecidos como “gastos discricionários”, terminará nos próximos anos.

 

🔎Entre esses gastos livres, há políticas públicas importantes, como bolsas de estudo, fiscalização ambiental e do trabalho, assim como o farmácia popular.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já admitiu que, no ritmo atual, gastos livres dos ministérios tendem a sumir: ‘Vamos ter de fazer um debate sobre isso’.

Por essa lógica, não adianta elevar a arrecadação, como vem fazendo a equipe econômica, para equilibrar as contas. É preciso, necessariamente, cortar gastos obrigatórios.

A previsão do TCU é que, se nada for feito, o espaço para essas políticas importantes para a população acabará nos próximos anos, paralisando a máquina pública.

Com o arcabouço fiscal em risco, podendo ser abandonado, deixaria de existir uma regra que controlasse as contas públicas, o que, por sua vez, elevaria mais a dívida do setor público, que já é alta para o padrão dos países emergentes.

Isso aumentaria ainda mais os juros futuros, que servem de base para os empréstimos às famílias, para o consumo, e ao setor privado — e também pressionaria para cima a taxa de câmbio (dólar).

Essa dúvida sobre as contas públicas, que está sendo chamada pelo mercado financeiro de “risco fiscal”, já está cobrando seu preço, com alta do dólar e dos juros futuros.

O próprio Banco Central cita o aumento de gastos em seus comunicados, explicando que isso também pressiona a inflação.

 

Segundo a instituição, a “percepção mais recente dos agentes de mercado sobre o crescimento dos gastos públicos e a sustentabilidade do arcabouço fiscal vigente, junto com outros fatores, vem tendo impactos relevantes sobre os preços de ativos [dólar, juros futuros e bolsa de valores] e as expectativas [de inflação]”.

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