Bloqueio, bolha ou cúpula: como evento agravado pelo El Niño e pela Crise do Clima causa onda de calor
Bloqueio, bolha ou cúpula: como evento agravado pelo El Niño e pela Crise do Clima causa onda de calor
Temperatura está 5ºC acima da média em alguns estados neste fim de inverno: Criciúma bateu 40,7°C. País está sob efeito de fenômeno que impede o avanço das massas de ar frio, o que causa mais chuva no RS.
Por Júlia Putini, Mariana Garcia, g1
Bolha de ar
quente ou “cúpula” são formas simplificadas de nomear o fenômeno que
faz estados do Centro-Sul do Brasil sofrerem com uma onda de calor. Ela já
causa efeitos e vai se agravar até o fim de semana.
Tecnicamente,
os meteorologistas dizem que há um “bloqueio atmosférico” em atuação:
uma área de alta pressão no centro do país que está ganhando força e que impede
a entrada das massas de ar frio. O calorão de agora é diferente do visto na
terceira semana de agosto, que foi logo sucedido por uma frente fria.
Sem novas
frentes frias fortes o suficiente para quebrar o bloqueio, as temperaturas
nestes últimos dias do inverno já estão cinco graus acima da média
climatológica em alguns estados e esse número pode subir para 10°C a partir de
sexta (área em vermelho no mapa abaixo).
Fatores que ampliam o calorão
Mas
bloqueios atmosféricos são comuns. O que faz o atual virar motivo de
preocupação são os fatores listados abaixo:
El Niño
atípico: o fenômeno que está mais intenso neste ano: ele aquece as águas do
Oceano Pacífico e freia a atuação de frentes frias no Brasil; ele dá força para
o bloqueio atmosférico;
Aquecimento
global: especialistas afirmam que a queima de combustíveis fósseis torna
eventos extremos (ciclones, enchentes e etc.) mais prováveis, e que ondas de
calor recentes na Europa teriam sido praticamente impossíveis sem as mudanças
climáticas;
Setembro: é
naturalmente um mês de altas temperaturas no centro do Brasil devido à
combinação do final do período seco e ao aumento da radiação solar.
1 – O El Niño atípico
De acordo
Cesar Soares, meteorologista da Climatempo, as ondas de calor vistas neste ano
no Brasil são sim potencializadas pelo fenômeno climático El Niño. “Ele
faz com que poucas massas de ar de origem polar consigam avançar pelo Brasil,
dessa forma esquenta bastante”, afirma Soares.
O
meteorologista do Cemaden Giovani Dolif afirma que o atual cenário de El Niño
(e aquecimento global) sinaliza que podemos ter temperaturas acima da média
tanto na primavera quanto no verão. “A previsão de pico do El Niño é no
final do ano. Ele só deve perder força no meio do semestre do ano que
vem”, afirma Dolif.
Ainda em
maio, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) tinha divulgado comunicado
alertando para o risco de o El Niño provocar recordes de temperatura pelo mundo
em 2023. O verão no Hemisfério Norte (junho, julho e agosto) já foi o mais
quente da história e ano deve bater o mesmo recorde.
2 – Aquecimento global
“Temos
a combinação de duas coisas: o El Niño e a mudança climática global. O planeta
está bem quente, julho bateu o recorde do mês mais quente já registrado na
Terra, os oceanos estão mais quentes”, resume o meteorologista Giovani
Dolif.
Eventos
extremos do clima sempre existiram e existirão, mas os cientistas da área
afirmam que a influência da atividade humana no clima é responsável por
aumentar a probabilidade de suas ocorrências e já cravam que, sem o aquecimento
global, algumas ondas de calor seriam improváveis.
Entre muitos
cientistas que analisam o tema, a World Weather Attribution (WWA) conduz
análises de atribuição de eventos meteorológicos globais. A WWA já aponta que a
correlação entre extremos de temperatura e o aquecimento global é mais direta
do que no caso das grandes tempestades ou acumulados de chuva.
Sem o
aquecimento global, os recentes recordes de 40 ºC no Reino Unido seriam
praticamente impossíveis, assim como a onda de calor de 2021 na América do
Norte, indicam as análises da WWA. A mudança climática tornou 30 vezes mais
prováveis as ondas de calor mortal precoces do ano corrente, na Índia e no Paquistão,
de acordo com a WWA.
3 – Setembro: seco e com mais sol
O
especialista Giovani Dolif, do Cemaden, lembra que setembro é um mês onde
tipicamente as temperaturas são mais altas em boa parte do centro do país, uma
combinação de final de período seco e aumento da radiação solar.
“O
mínimo que recebemos do sol é no final de junho, quando começa o inverno,
quando temos a menor energia do sol. Já o pico máximo é no final de dezembro.
Em setembro começamos a sentir o sol com mais intensidade e como é o final da
estação seca, não temos umidade”, afirma Dolif.
Cesar Soares
lembra que, desde o domingo, as temperaturas em parte do Sul, Sudeste e
Centro-Oeste estão bem elevadas, mais de 5 graus acima da média climatológica.
“Isso faz com que a gente configure uma condição de onda de calor, afinal
a previsão indica que tais temperaturas devem permanecer até pelo menos o fim
dessa semana”, afirma.
Próximos dias
O panorama
previsto pelos meteorologistas do Inmet aponta uma possível piora da situação a
partir de sexta-feira (22). As temperaturas máximas devem passar dos 40°C em
áreas das regiões Centro-Oeste e Norte, além do interior de São Paulo. Na
capital paulista são esperadas temperaturas máximas acima dos 35°C a partir de
sexta.
Cesar
Soares, meteorologista da Climatempo, diz que, novamente, as nuvens carregadas
com chuva estão todas voltadas para o Rio Grande do Sul, estado que tem
previsão de novos temporais nesta semana.
Marcelo
Martins, meteorologista do Cemaden, diz que, na região, o calor dá uma pequena
trégua a partir desta terça-feira (19), com cobertura de nuvens, chuva, vento o
risco de temporais. Na de quinta-feira (21) volta esquentar.
Em Criciúma,
na segunda-feira, os termômetros bateram 40,7°C. O segundo recorde de calor
para a região foi em Joinville, em agosto, com 38,7°C.