Estratégia de Maduro em Essequibo é direcionada ao público interno da Venezuela
Estratégia de Maduro em Essequibo é direcionada ao público interno da Venezuela
Em manobra típica de regimes autoritários, presidente abre frente externa para recuperar popularidade desviar atenções do desgaste registrado mais de duas décadas do chavismo.
Por Sandra Cohen
Com o que
chamou de novo mapa da Venezuela, incluindo a anexação arbitrária da região de
Essequibo, Nicolás Maduro deixou claro que a estratégia nacionalista é direcionada
ao público interno.
O foco no
inimigo externo é um recurso manjado de regimes autoritários para desviar a
atenção dos graves problemas internos. Maduro escolheu o ufanismo para nortear
a sua campanha eleitoral chavista, com o objetivo da reeleição, no próximo ano.
Logo após o
controverso referendo consultivo sobre Essequibo, o procurador-geral Tarek
William Saab ordenou a prisão de colaboradores próximos de María Corina
Machado, a principal adversária de Maduro, inabilitada pelo regime para
concorrer a cargos públicos por 15 anos.
O dirigente do partido Vente Venezuela, o coordenador de campanha e a chefe de Comunicação estão entre os dez acusados de apátridas e conspiração transnacional — outra fórmula recorrente do regime para atingir seus opositores.
Conforme
denunciou o procurador-colaborador de Maduro, os acusados “dirigem ações
desestabilizadoras e conspiratórias, patrocinadas por um grupo de pessoas
covardes no exterior, sem cessar o seu desejo de ódio imemorial contra o povo
da Venezuela”.
A decisão
foi antecipada pelo próprio presidente dois dias antes, quando, em seu programa
semanal, acusou políticos opositores de receberem financiamento da petrolífera
americana ExxonMobil, que explora recursos de Essequibo para a Guiana.
Classificado
por dirigentes chavistas como sucesso, o referendo de domingo sobre o
território que equivale a 70% da Guiana levantou denúncias sobre a participação
de eleitores, já que os postos de votação estiveram desertos. Os números
apresentados pelo Conselho Nacional Eleitoral, dirigido por um fiel aliado de
Maduro, foram questionados e tachados de inflacionados.
O desgaste
de seu governo de dez anos — sem incluir os 14 do antecessor, Hugo Chávez — se
escancara nas pesquisas.
No início de
novembro, uma pesquisa da Delphos, apontava apenas 18% das intenções de votos
para Maduro. A rejeição popular a ele, em torno de 15%, é a pior em uma década
de gestão: mais de 80% querem mudança de liderança. Há quem, em seu próprio
partido, defenda a substituição do líder por outro candidato.
“Maduro é
uma máquina destruidora de votos. Insistir com ele será um suicídio político
para o PSUB”, resumiu o ex-ministro chavista e dissidente Andrés Izarra ao site
“Efecto Cocuyo”. Ele também integra a lista dos acusados, com ordem de prisão,
pelo procurador-geral Saab.
Opositores e
analistas políticos especulam que Maduro está acirrando a retórica anexionista
de Essequibo e o confronto com a Guiana para postergar as eleições,
estabelecidas para o segundo semestre de 2024 pelos acordos assinados em
Barbados.
Imediatamente
após o referendo, o presidente exibiu um mapa fictício do país, incluindo o
novo estado de Guiana Essequiba, nomeou um general para supervisionar a região
e anunciou a cidadania venezuelana para seus habitantes. Não explicou, contudo,
como fará para empreender suas pretensões, até agora no campo da falácia.
Maduro conta
com o apoio na Venezuela, inclusive da oposição, sobre a soberania de
Essequibo; por isso, conduz sua estratégia ufanista. A própria María Corina
Machado apresentou um projeto de lei em 2014, quando era deputada, propondo a
defesa do território e o desenvolvimento da infraestrutura e concedendo
cidadania venezuelana a seus habitantes. Ficou guardado na gaveta chavista.
Só agora, oito anos após a descoberta pela Guiana de importantes reservas de petróleo em Essequibo, Maduro se interessou por reivindicar a soberania da região, com decisões unilaterais, copiando a tática dos autocratas. Abrir essa frente, insinuando a retórica belicista no discurso subliminar, é mais um indicativo de que seu interesse é oportunista, numa tentativa de recuperar a popularidade e, mais uma vez, afastar os opositores das urnas.