Grupo de 30 homens abre fogo contra a polícia no norte do Kosovo; ao menos duas pessoas morreram

Grupo de 30 homens abre fogo contra a polícia no norte do Kosovo; ao menos duas pessoas morreram

Autoridades atribuem o ataque a sérvios. Países vivem tensão, pois, apesar de ser reconhecida por mais de 100 países, o governo sérvio ainda considera a região como parte de seu território.



Por g1

Um grupo de 30 homens fortemente armados abriu fogo contra a polícia do Kosovo na aldeia de Banjska, norte do país neste domingo (24). Segundo as autoridades do país, o tiroteio deixou um policial morto e outro ferido. Um suspeito também morreu.

A polícia diz que dois veículos pesados sem placas bloquearam a entrada da aldeia e passaram a disparar contra as unidades policiais que verificaram a ocorrência com armamento pesado, incluindo granadas.

Os mesmos homens armados também invadiram um mosteiro ortodoxo sérvio da região. De acordo com a Diocese da Igreja Ortodoxa Sérvia de Raska-Prizren, homens mascarados forçaram a entrada no mosteiro. Padres e peregrinos trancaram-se dentro do templo do mosteiro por segurança.

O primeiro-ministro do país, Albin Kurti, atribuiu os ataques aos sérvios e descreveu o incidente como uma ação terrorista, de “criminosos patrocinados pela Sérvia”.

“Neste momento, continuam a ocorrer disparos com armas de fogo de vários calibres contra a nossa polícia. Os agressores são profissionais usando máscaras e fortemente armados”, disse no Facebook.

O Kosovo é um país independente, reconhecido pela ONU, que faz fronteira com a Sérvia, Montenegro, Albânia e Macedônia. O país conquistou sua independência da Sérvia em 17 de fevereiro de 2008, pouco mais de 15 anos atrás.

O maior dos problemas entre os dois países se dá porque o governo sérvio insiste em dizer que, formalmente, a região ainda faz parte de seu território. A tensão do conflito gera episódios violentos entre seus habitantes.

Os albaneses constituem mais de 90% da população no Kosovo, mas os sérvios são maioria na região norte, onde aconteceram os ataques. O ataque foi o primeiro caso violento na região desde maio.

Além do primeiro-ministro, Blerim Vela, chefe de gabinete do presidente do Kosovo, também responsabilizou os sérvios pelo ataque. “Os ‘homenzinhos verdes’ da Sérvia com veículos blindados estão a 15 km dentro do território do Kosovo (Banjska), onde um ataque terrorista contra a polícia do Kosovo resultou na morte de um policial e em outro ferido”, disse ele, no Twitter.

A agência Reuters acompanha o patrulhamento de tropas da missão de paz da OTAN junto com a polícia do Kosovo em uma das estradas que leva a Banjska.

 

Entenda o conflito

Em maio, o tenista sérvio Novak Djokovic comemorou uma de suas vitórias em Roland Garros com uma mensagem ultranacionalista. O atleta escreveu na lente de uma das câmeras do evento “Kosovo é o coração da Sérvia”.

A atitude foi vista por autoridades kosovares como uma provocação, e elas acusaram o tenista de aumentar a tensão política na região.

Em fevereiro de 1998, teve início um dos episódios mais sangrentos da Europa pós-Segunda Guerra Mundial. A Guerra do Kosovo, como ficou conhecida, vitimou mais de 10 mil pessoas em um conflito que colocava frente a frente militares da Iugoslávia, da Albânia e, posteriormente, da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Em março de 1999, as forças da OTAN iniciaram uma campanha de bombardeios contra a Iugoslávia. Quase três meses depois, um acordo de paz foi alcançado e as forças sérvias se retiraram do Kosovo. A região foi, então, colocada sob administração das Nações Unidas (ONU).

 

Como é o Kosovo?

A nação é formada por uma maioria de origem albanesa, cerca de 90% da população, dividida por todo o território. As pessoas de etnia sérvia representam 5% do total e estão concentradas no norte do país.

Essa região, conhecida como Kosovo do Norte, é o centro da maior parte das discussões. A mais recente delas perdura há meses diz respeito à autoridade do governo de Pristina no local.

Um dos principais temas é a mudança nas placas dos carros: Kosovo quer que os civis do norte troquem suas placas sérvias, que datam da era pré-independência, por aquelas emitidas por Pristina. Cidadãos de etnia sérvia se recusam.

Recentemente, o Kosovo passou por eleições regionais. A maioria da população de etnia sérvia, no norte, boicotou o pleito por não querer responder à administração kosovar. Com isso, os candidatos à prefeitura que venceram em muitas cidades do norte são de etnia albanesa.

 

Conflitos violentos

No decorrer desta semana, cerca de 30 soldados de paz da OTAN ficaram feridos em combates na cidade de Zvecan.

Os sérvios avançaram na direção da prefeitura da cidade, entraram em confronto com a polícia em Zvecan e pintaram veículos da Otan usando sprays com a letra “Z”, referindo-se a um sinal russo usado na guerra na Ucrânia.

Após os confrontos, a OTAN anunciou o envio de mais 700 soldados de paz para o país.

 

Qual a solução?

A solução pensada pelos sérvios do norte é a de criar uma associação dos municípios em que a maioria seja de sérvios para operar com autonomia do governo kosovar.

Pristina rejeita isso alegando ser uma receita para a criação de um “mini estado” dentro de Kosovo, dividindo o país em linhas étnicas.

 

Adesão à União Europeia

O conflito frequente entre as regiões desde a independência kosovar afastou os dois países de uma filiação à União Europeia (UE).

Uma das exigências da UE para iniciar o processo de adesão era que houvesse conversas biltilaterais para garantir a paz na região.

Apesar disso, a OTAN mantém cerca de 4 mil soldados em Kosovo para garantir a continuidade da independência local.

 

Plano de paz proposto pela UE

Enviados dos Estados Unidos e da União Europeia para mediar o conflito estão pressionando a Sérvia e o Kosovo para aprovar um plano apresentado em meados de 2022.

Nesse plano, o governo sérvio deixaria de fazer lobby contrário a assentos para Kosovo em organizações internacionais, incluindo as Nações Unidas.

Do outro lado, Kosovo se comprometeria a formar uma associação dos municípios de maioria sérvia.

Além disso, os dois países abririam escritórios de representação na capital um do outro, para ajudar a resolver disputas pendentes.

 

O que os países dizem

O presidente da Sérvia indica aceitar a ideia.

Já o primeiro-ministro de Kosovo, nem tanto. Ele disse que concordaria com ressalvas, entre elas, a de discutir possíveis termos para a autogovernança de sérvios em seu país.

Uma das dificuldades para o avanço na negociação é a existência de membros nacionalistas de linha dura nos governos de ambos os países.

O que está em jogo para os moradores do Kosovo do Norte?

A administração local e funcionários públicos, professores, médicos e grandes projetos de infraestrutura são pagos pela Sérvia.

Os moradores da região temem que, uma vez totalmente integrados ao Kosovo, possam perder acesso ao sistema de saúde público gratuito da Sérvia e serem forçados a aderir ao sistema de saúde privado do Kosovo, entre outros benefícios dados pelo governo sérvio e que não têm equivalentes no kosovar.

Criança balança bandeira de Kosovo durante comemoração do dia da independência do país — Foto: Visar Kryeziu/AP
Mapa indica posição do Kosovo nos Bálcãs, sudeste da Europa — Foto: Arte/g1

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