Incerteza nos mercados e expectativa de inflação em alta preocupam BC
Incerteza nos mercados e expectativa de inflação em alta preocupam BC
Desafio de equilibrar contas públicas impacta expectativas.
Publicado por Andreia Verdélio – Repórter da Agência Brasil - Brasília
O Comitê de
Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) mostrou preocupação com as
incertezas nos mercados e as expectativas de inflação acima da meta. São
fatores que impactam a decisão do BC sobre a taxa básica de juros, a Selic.
Para os
membros do colegiado, em reunião na semana passada, entre as razões estaria a
preocupação de agentes financeiros com a política fiscal de equilíbrio das
contas públicas do país.
“As
expectativas de inflação, após apresentarem reancoragem parcial, seguem sendo
um fator de preocupação”, diz a ata da reunião, divulgada nesta terça-feira
(26) pelo BC, em Brasília.
“Entre as possibilidades que justificariam
observarmos expectativas de inflação acima da meta estariam as preocupações no
âmbito fiscal, receios com a desinflação global e a possível percepção, por
parte de analistas, de que o Copom, ao longo do tempo, poderia se tornar mais
leniente no combate à inflação”, explica o documento.
Para o BC, a
redução das expectativas virá por meio de “uma atuação firme, em consonância
com o objetivo de fortalecer a credibilidade e a reputação tanto das
instituições como dos arcabouços econômicos”.
O Copom
avalia que, parte da incerteza observada nos mercados, com reflexo nas
expectativas de inflação, estava anteriormente mais em torno do desenho final
do arcabouço fiscal e atualmente se refere mais à execução das medidas de
receita e despesas compatíveis com o arcabouço e o atingimento das metas
fiscais.
No projeto
do Orçamento de 2024, o governo federal prevê zerar o déficit primário nas
contas públicas, conforme estabelece o novo arcabouço fiscal. O ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, já manifestou que o cumprimento dessa meta é um
desafio, que depende do aumento da arrecadação.
“Tendo em
conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a
ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da
política monetária, o Comitê reforça a importância da firme persecução dessas
metas”, reforçou o colegiado do Banco Central, em ata.
Inflação
Na semana
passada, o Copom decidiu reduzir a taxa Selic, de 13,25% ao ano para 12,75% ao
ano. O comportamento dos preços fez o BC cortar os juros pela segunda vez no
semestre, em um ciclo que deve seguir com cortes de 0,5 ponto percentual nas
próximas reuniões. Após sucessivas quedas no fim do primeiro semestre, a
inflação voltou a subir na segunda metade do ano, mas essa alta era esperada
por economistas.
A taxa Selic
é o principal instrumento de BC para alcançar a meta de inflação, definida pelo
Conselho Monetário Nacional (CMN).
“A inflação
ao consumidor segue com uma dinâmica corrente mais benigna, exibindo
desaceleração tanto na inflação de serviços, quanto nos núcleos de inflação. Os
indicadores que agregam os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à
política monetária, que possuem maior inércia inflacionária, apresentaram menor
inflação, mas mantêm-se acima da meta”, informou o BC.
Dessa forma,
o Copom reforçou a necessidade de se manter uma política monetária ainda
contracionista para que se consolide a convergência da inflação para a meta em
2024 e 2025 e a ancoragem das expectativas. A meta definida pelo Conselho
Monetário Nacional para os próximos dois anos é de 3%, com intervalo de
tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Ou seja, o limite
inferior é 1,75% e o superior 4,75%.
Na ocasião
do Copom, as expectativas de inflação para 2023, 2024 e 2025 estavam em torno
de 4,9%, 3,9% e 3,5%, respectivamente. Os dados são do boletim Focus, pesquisa
divulgada semanalmente pelo BC com a projeção de analistas do mercado para os
principais indicadores econômicos.
Para 2023,
já é previsto o estouro da meta, que é de 3,25%, com o mesmo intervalo de tolerância
de 1,5 ponto percentual.
Em agosto –
influenciado pelo aumento do custo da energia elétrica – o Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – considerada a inflação oficial do país –
foi de 0,23%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O índice é
superior ao registrado em agosto do ano passado, quando houve deflação (queda
de preços) de 0,36%. O IPCA acumula taxa de 3,23% no ano. Em 12 meses, a
inflação acumulada é de 4,61%.
Juros neutros
Em sua ata,
o Comitê de Política Monetária do BC também apontou preocupação com a
possibilidade de elevação da taxa de juros neutra.
“O
esmorecimento no esforço de reformas estruturais, o aumento de crédito
direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o
potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios
sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de
desinflação em termos de atividade”, afirmou.
A taxa
neutra é aquela que nem estimula, nem desestimula a economia, ou seja, é a taxa
de juros real consistente para manter o nível de atividade econômica, com o
fomento ao pleno emprego e a inflação na meta.
Quando o BC
quer conter a demanda aquecida e frear a inflação, ele aumenta a taxa básica de
juros para uma posição acima do juro neutro. Já para incentivar a produção e o
consumo, o Copom diminui a Selic. Em caso de economia estável, com a inflação
no centro da meta, a Selic tende a ficar próxima da taxa neutra. Então, quanto
maior for o juro neutro, maior será a Selic.
De acordo
com o último Relatório de Inflação do BC, a média da taxa de juros real neutra
está em 4,8%, com intervalo entre 4,5% e 5%.
Projeções e riscos
Com relação
aos próximos passos da política de juros, os membros do Copom concordaram, por
unanimidade, que a expectativa de cortes de 0,50 ponto percentual na Selic nas
próximas reuniões é o ritmo apropriado “para manter a política monetária
contracionista necessária para o processo desinflacionário”. No mesmo sentido,
o BC afirmou, na ata, que é pouco provável que haja cortes maiores.
“Avaliou-se, ainda, que não há evidência de
que esteja em curso um aperto além do que seria necessário para a convergência
da inflação para a meta e que o cenário ainda inspira cautela, reforçando a
visão de serenidade e moderação que o Comitê tem expressado. O Comitê julga
como pouco provável uma intensificação adicional do ritmo de ajustes, já que
isso exigiria surpresas positivas substanciais que elevassem ainda mais a
confiança na dinâmica desinflacionária prospectiva”, diz a ata.
“Enfatizou-se
que a extensão do ciclo ao longo do tempo dependerá da evolução da dinâmica
inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária
e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de
maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto [capacidade
ociosa da economia] e do balanço de riscos [para a inflação futura]”,
acrescentou o BC.
As projeções
de inflação do Copom são de 5% para 2023, acima do teto da meta, 3,5% para 2024
e 3,1 para 2025. Para fazer essas estimativas, o Banco Central adotou a
hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro desses três anos, além de
taxa de câmbio partindo de R$ 4,9 e preço do petróleo seguindo a curva de alta
pelos próximos seis meses e aumentando 2% ao ano posteriormente.
Em ata, o
Copom ressaltou que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de
risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário
inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se uma maior persistência
das pressões inflacionárias globais e uma maior resiliência na inflação de
serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado.
Entre os
riscos de baixa de inflação estão uma desaceleração da atividade econômica
global mais acentuada do que a projetada e os impactos do aperto monetário
sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o
esperado.
“A
conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que
tende a ser mais lento e por expectativas de inflação com reancoragem parcial,
demanda serenidade e moderação na condução da política monetária”, informou o
BC.
Atividade econômica
O Copom
ainda avaliou um conjunto de indicadores recentes que indica “maior resiliência
da atividade econômica”. Superando as projeções, no segundo trimestre do ano a
economia brasileira cresceu 0,9%, na comparação com os primeiros três meses de
2023, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
Em relação ao segundo trimestre do ano passado, a economia brasileira avançou
3,4%.
O Produto
Interno Bruto (PIB – a soma dos bens e serviços produzidos no país) acumula
alta de 3,2% no período de 12 meses. No semestre, a alta acumulada foi de 3,7%.
Segundo o
BC, nos indicadores setoriais, observou-se alguma desaceleração no setor de
comércio, moderada reaceleração na indústria e estabilidade do crescimento no
setor de serviços, após ritmo mais forte nos trimestres anteriores. “O mercado
de trabalho segue resiliente, mas com alguma moderação na margem”, explicou.
Entre os
fatores para o crescimento mais resiliente nos últimos trimestres, o Copom
citou que a “pujança do setor agropecuário” tenha tido efeitos indiretos sobre
outros setores na economia, “o que é corroborado nos dados, mas não justifica
toda a magnitude da surpresa”.
“Outra
possibilidade é que a elevação de renda disponível, seja em função do dinamismo
do mercado de trabalho, da queda de preços de alimentos ou de programas de
transferência de renda, também tenha fornecido algum suporte para o consumo. O
Comitê se deteve sobre esse tema, identificado como muito relevante, e destacou
que a conjectura de um crescimento sustentado pela elevação da renda é
corroborada pela resiliência no consumo de serviços das famílias. Ademais,
discutiu-se, consequentemente, o possível impacto que poderia ocorrer sobre a
dinâmica da inflação de serviços em caso de um crescimento sustentado pela
renda e pelo consumo”, explica a ata.
Edição:
Kleber Sampaio