Metade dos brasileiros conhece uma mulher que já foi agredida pelo parceiro ou ex, mas 94% dos homens dizem nunca ter agredido, diz Ipec
Metade dos brasileiros conhece uma mulher que já foi agredida pelo parceiro ou ex, mas 94% dos homens dizem nunca ter agredido, diz Ipec
Mais de metade das vítimas (55%) reagiu às agressões colocando um fim no relacionamento; Somente 1 em cada 5 denunciou o parceiro às autoridades policiais e/ou contou para um amigo ou familiar, diz pesquisa
Por Renata Bitar, Paula Lago e Cíntia Acayaba, g1 SP — São Paulo 17/11/2022 04h00 Atualizado há 56 minutos
No Brasil,
50% das pessoas conhecem pessoalmente alguma mulher que sofre ou já sofreu
algum tipo de agressão por parte do atual ou do antigo companheiro. Porém,
apenas 6% dos homens admitem já terem cometido violência doméstica.
É isso o que
aponta uma pesquisa realizada em outubro deste ano pelo Ipec (Inteligência em
Pesquisa e Consultoria Estratégica), em parceria com o Instituto Patrícia
Galvão e o Instituto Beja e obtida com exclusividade pelo g1. O nível de
confiabilidade é de 95%, e a margem de erro é de 3 pontos percentuais para mais
ou para menos.
Após tomar
conhecimento de casos de violência, a maioria dos brasileiros procura as
vítimas para conversar e, no geral, oferece conselhos focados na segurança e no
bem-estar das mulheres, como para denunciarem as agressões à polícia (53%) e
terminarem o relacionamento (48%).
Contudo, uma
minoria recomenda que as vítimas tomem atitudes visando a manutenção da
relação, como para procurarem a igreja (8%) – sendo as mulheres as que mais dão
este conselho –, mudarem de comportamento para que o parceiro não fique
irritado (7%) e reconsiderarem e fazerem as pazes (6%) – sendo os homens os que
mais falam isso.
Apenas 1 em
cada 4 homens conversa com o agressor depois de ficar sabendo sobre um caso de
violência doméstica. Esse número é ainda menor entre as mulheres – somente uma
em cada 10.
Fabíola
Sucasas Negrão Covas, promotora de Justiça do Ministério Público (MP) de São
Paulo e titular da Promotoria de Enfrentamento da Violência Doméstica do MP-SP,
afirma que esse comportamento tem relação com ser capaz de reconhecer o
agressor como autor de uma violência.
“É como
se aqueles homens relutassem em reconhecer determinados comportamentos como
formas de violência. É preciso um engajamento maior dos homens, é uma mudança
cultural que precisamos adotar. Há homens que insistem nesses estereótipos
baseados em relacionamentos de controle e dominação. É preciso compreender que
gênero é uma palavra jurídica, que ela está na raiz do problema e que é preciso
desconstruir o sistema de dominação que, historicamente, foi determinado nas
vivências do ser homem e do ser mulher.”
O conselho
mais dado aos agressores é para que mudem de comportamento (55%), seguido da
recomendação de que terminem o relacionamento (41%) e procurem uma ajuda
especializada (34%), como atendimento psicológico.
As
vítimas
Das 800
mulheres entrevistadas pelo Ipec, 36% afirmaram já ter sofrido algum tipo de
violência doméstica:
Psicológica
(27%) – ameaças,
humilhação, xingamentos, insultos, chantagem, proibição de encontrar amigos ou
familiares, etc
Física
(17%) – agressões
físicas, como tapas, empurrões, etc
Moral
(13%) – difamação,
disseminação de mentiras, exposição da vida íntima, etc
Sexual
(10%) – relações ou
práticas sexuais forçadas (sem consentimento)
Patrimonial
(7%) – não poder
controlar o próprio dinheiro, ter objetos pessoais destruídos ou danificados,
etc.
Mais de
metade das vítimas (55%) reagiu às agressões colocando um fim no
relacionamento. Somente 1 em cada 5 denunciou o parceiro às autoridades
policiais e/ou contou para um amigo ou familiar.
8% das
mulheres agredidas não fizeram nada. “Muitas mulheres que se encontram em
situação de violência doméstica vivem sob constante ameaça por seus parceiros
ou ex-parceiros e adotam o silêncio por medo, vergonha e insegurança. Por isso
é tão importante que elas contem com apoio, para que não se sintam sozinhas e
busquem os meios para encerrar o ciclo de violência”, explicou Jacira
Melo, diretora do Instituto Patrícia Galvão.
Thalia
Karoline: imagens mostram marido puxando a esposa pelo cabelo antes de matá-la
em casa; vítima tinha duas filhas
Jenifer
Cristina: Mãe de jovem morta pelo ex com 5 tiros relata vida de perseguição e
ameaças contra filha: “Era um pesadelo”
Onde
estão os agressores?
Dos 400
homens ouvidos pelo Ipec, 6% admitiram já ter agredido as companheiras ou
ex-companheiras de algum modo e, dentre eles, a maioria afirmou ter resolvido a
situação na base do diálogo. Os 94% restantes negaram já ter praticado qualquer
tipo de violência doméstica.
Contudo, uma
em cada 10 mulheres relatou já ter sido submetida pelo parceiro (atual ou
antigo) a relações sexuais não consentidas, mas todos os entrevistados negaram
já ter cometido violência sexual alguma vez. Portanto, onde estão os
agressores?
Segundo Jacira
Melo, pesquisas já realizadas pelo Instituto reforçam que há uma tendência
masculina à negação de práticas de violência doméstica, importunação, assédio e
violência sexual.
“A conta não fecha. Hoje as mulheres sabem identificar quando estão sofrendo algum tipo de violência de gênero. Muitas mulheres relatam experiências de violência doméstica e violência sexual, mas são raros os homens que assumem essas práticas, possivelmente por naturalizarem como um direito.”