Pacote automotivo: especialista elogia programa, mas questiona prazo
Pacote automotivo: especialista elogia programa, mas questiona prazo
Medida foi anunciada esta semana como socorro ao setor.
Publicado em 08/06/2023 - 08:50 Por Wellton Máximo – Repórter da Agência Brasil - Brasília
Anunciado
nesta semana como medida de socorro ao setor automotivo, o pacote que barateia
temporariamente a compra de carros, ônibus e caminhões pode não surtir o efeito
esperado sobre a indústria. Segundo especialistas, a curta duração e o volume
de recursos do programa de ajuda podem resultar num alcance limitado, que pouco
mudará a situação do setor.
Professor de
economia do Ibmec, Gilberto Braga elogia o programa, mas questiona o prazo
limitado de quatro meses e o montante de R$ 1,5 bilhão, que considera baixo.
“O ideal era
que o programa tivesse um prazo maior para que o efeito fosse mais duradouro”,
diz Braga. Segundo ele, o setor automotivo ainda tem peso grande na economia e
na geração de empregos e demandaria mais atenção neste momento de juros altos e
de restrição ao crédito.
De acordo
com o professor, no setor de caminhões e ônibus, o prazo limitado do programa
pode surtir o efeito contrário, resultando no endividamento de transportadoras
e de motoristas sem reservas financeiras e que serão pressionados a tomar uma
decisão rápida sobre a renovação da frota.
“Um caminhão
tem uma vida útil muito longa. Portanto, uma decisão com impacto sobre toda uma
vida produtiva não pode ser tomada num curto espaço de tempo”, avalia.
Formato
O professor
elogiou o formato do programa, principalmente a decisão de combinar critérios
sociais, ambientais e o peso na indústria de determinada marca de veículo para
estabelecer os descontos, que variam de R$ 2 mil a R$ 8 mil. Segundo ele, o
pacote está na direção certa, mas precisaria ser ampliado para surtir efeito
duradouro sobre a indústria automotiva.
“Considero o
pacote positivo porque acumula elementos distintos que atendem às
reivindicações de um setor importante para a economia, que ainda tem as
rodovias como principal eixo modal”, afirma Braga.
A concessão
de descontos está baseada num sistema de pontuação que avalia três critérios.
Preços baixos (para priorizar os modelos populares), equipamentos antipoluentes
(para incentivar a compra de modelos que poluem menos) e geração de empregos na
indústria e uso de peças nacionais (para premiar as marcas com maior peso da
indústria nacional).
Para ônibus
e caminhões, o desconto está atrelado ao compromisso de mandar veículos com
mais de 20 anos de uso para a reciclagem, sendo necessária a comprovação de que
o comprador enviou o veículo antigo para o desmonte.
Créditos
tributários
Constituído
sob a forma de créditos tributários (desconto em tributos futuros), o pacote de
ajuda consumirá R$ 1,5 bilhão – R$ 700 milhões para caminhões, R$ 500 milhões
para carros e R$ 300 milhões para ônibus e vans. Diferentemente dos programas
anteriores, em que o governo reduzia o Imposto sobre Produtos Industrializados,
mas não tinha garantia de que os fabricantes repassariam o desconto, o novo
pacote estimula que as concessionárias vendam mais barato e repassem o crédito
tributário à indústria.
Diretora da
Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão consultivo do Senado que faz
análises econômicas, a economista Vilma Pinto diz que o sistema de crédito
tributário representa uma novidade. Ela considera o volume de R$ 1,5 bilhão
baixo diante das receitas totais do governo (estimadas em R$ 1,911 trilhão pelo
Ministério do Planejamento). No entanto, diz que o pacote vai na direção
contrária do novo arcabouço fiscal.
“De fato,
não haverá impacto fiscal por causa da reoneração parcial do diesel [que terão
o PIS e a Cofins aumentados em R$ 0,11 daqui a três meses], mas esse R$ 1,5
bilhão para o programa, cujo impacto foi neutralizado neste momento, poderá
fazer falta no futuro porque o governo se comprometeu em buscar receitas para
cumprir as metas ambiciosas propostas no novo arcabouço”, comenta a diretora da
IFI.
Segundo
Vilma Pinto, o órgão ainda não fez os cálculos de quanto o programa deverá
gerar de empregos nem do impacto sobre o Produto Interno Bruto (PIB, soma dos
bens e serviços produzidos). Em relação à inflação, ela diz que o impacto do
aumento do diesel sobre os índices de preços pode ser baixo por causa do
barateamento dos veículos.
Transporte
coletivo
Inicialmente
restrito aos carros populares, o programa atraiu críticas de ambientalistas
porque não tinha medidas de estímulo ao transporte coletivo. A decisão de
incluir a renovação de ônibus, caminhões e vans, diz o professor Gilberto
Braga, reforçou um caráter ambiental ao programa. Segundo ele, uma duração
maior para a renovação de veículos pesados favoreceria a transição energética,
mesmo estimulando, neste momento, a compra de veículos movidos a diesel.
Segundo o
professor, o ideal seria que o incentivo de curto prazo fosse conciliado com
uma política industrial de produção de veículos elétricos. “A transição para os
veículos elétricos é gradual. Neste momento, é onerosa para o público. Enquanto
não cair os preços dos carros elétricos ou híbridos, os carros tradicionais
continuarão a ser competitivos”, ressalta. “Na verdade, não vejo como seria
possível abrir mão da cadeia produtiva tradicional da indústria automotiva, que
é um dos pilares da economia do país.”
O professor
cita o exemplo do modelo Renault Kwid. Segundo Braga, enquanto a versão
tradicional custa em torno de R$ 60 mil (já com o desconto do pacote), a versão
elétrica custa R$ 140 mil. “Esse é o carro elétrico mais barato do Brasil no
momento, inacessível para a maioria da população”, destaca.
Edição:
Aécio Amado