Poder de compra do brasileiro foi corroído quase que pela metade em 10 anos; entenda
Poder de compra do brasileiro foi corroído quase que pela metade em 10 anos; entenda
Salário médio da população teria quase que dobrar para que uma pessoa conseguisse adquirir a mesma quantidade de itens que em 2013. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerada a inflação oficial do país, subiu quase 90% no período.
Por Artur Nicoceli, g1
O poder de
compra do brasileiro foi corroído quase que pela metade entre 2013 e 2023. Isso
porque o preço dos produtos nos mercados quase dobrou, enquanto o salário médio
anual ficou praticamente estagnado em termos nominais.
Mas o que é
a perda de poder de compra? É a sensação de que agora se compra menos itens no
mercado do que antes com a mesma quantia de dinheiro. Ou que é preciso
desembolsar mais para comprar a mesma quantidade de produtos.
O g1 montou
o infográfico abaixo para mostrar esse efeito. Com R$ 100 a preços de 10 anos
atrás, foi possível montar uma cesta de 13 produtos básicos para o carrinho do
supermercado. Considerando as correções até o ano passado, os mesmos R$ 100 não
compram metade das mercadorias selecionadas.
E essa necessidade de gastar mais enxugou a carteira do brasileiro, já que o salário médio anual não acompanhou os reajustes de preços.
O Índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerada a inflação oficial
do país, subiu 88% em 10 anos;
O salário
médio anual do brasileiro, considerando 13º e férias, por sua vez, aumentou
cerca de 3% no período. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD), do IBGE, o valor passou de R$ 38.484,44 para R$ 39.604,44.
O poder de
compra do brasileiro caiu em todos os anos desde 2013, apontou um estudo
realizado pela consultoria financeira L4 Capital.
Em 2013, por
exemplo, o brasileiro ganhava um salário médio anual sem descontar a inflação
de R$ 38.484,44, e tinha disponível para gastar com serviços e produtos um
total de R$ 3.028,05 por mês (o equivalente a R$ 36.336,65 por ano,
considerando a inflação).
Essa
quantia, inclui itens como mercado, aluguel, combustível, despesas pessoais
etc. Com o tempo, porém, foi cada vez mais necessário cortar itens da lista de
compras.
Assim, em
2023, apesar do salário nominal (sem os descontos da inflação) ser de R$
39.604,44, a quantia disponível para gastar com produtos e serviços diminuiu
42%, para R$ 1.755 por mês (R$ 21.064,16 por ano).
Por que isso acontece?
Segundo
especialistas entrevistados pelo g1, a perda de poder de compra foi tão
considerável por dois motivos: inflação relevante e baixa produtividade profissional.
O Brasil não
teve um período deflacionário nos últimos 10 anos. Ou seja, ano após ano, os
preços de itens compilados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) subiram. Apenas em alguns meses se viu alguma queda, mas em itens localizados
e sem força suficiente para haver um recuo na média anual.
Saiba mais
Para Rachel
de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos, é preciso dar um destaque
especial a dois períodos, em que a inflação subiu acelerou ainda mais: a crise
de 2015 e a pandemia de Covid-19. Nos dois períodos, os preços subiram por
volta de 10% no ano, e não houve um aumento salarial equivalente.
“[Há
cerca de oito anos], as escolhas econômicas da então presidente Dilma Rousseff
(PT), como excesso de gastos públicos e estímulos a demanda privada, reduziram
a potência da política monetária do país”, afirmou a especialista.
À época, o
governo tomou medidas como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados
(IPI) para automóveis e o estímulo de uso de bancos públicos, como o BNDES,
para subsidiar empréstimos às custas do Tesouro Nacional.
Ao mesmo
tempo, o BC manteve uma política monetária expansionista, com redução da taxa
Selic a despeito da inflação acima da meta, incentivando a demanda agregada e
contribuindo para a alta de preços.
Na pandemia,
por sua vez, a situação era outra. Houve um aumento forte da inflação tanto no
Brasil quanto no mundo porque diversos países fecharam fronteiras dado o
excesso de casos de Covid-19, causando um desajuste completo da oferta de
produtos.
“Houve
um desequilíbrio em toda a cadeia de produção e, consequentemente, nos preços
[dos produtos]”, diz Rachel, da Rico.
Entre os
alunos brasileiros de 15 anos (ou seja, que acabaram de cursar o ensino
fundamental II), 73%, por exemplo, ficaram abaixo do nível 2 em conhecimentos
matemáticos no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes 2022 (o Pisa,
em inglês).
Isso
significa que esses adolescentes não conseguem fazer operações simples, como:
– converter
moedas: dizer, por exemplo, quantos reais equivalem a 2 dólares, sabendo que 1
dólar = R$ 4,93;
– Ou comparar
as distâncias percorridas por um carro em dois caminhos diferentes.
“Para
melhorarmos a renda do brasileiro, é preciso melhorar na produtividade e, para
tal, o país precisa ter uma qualidade melhor de ensino. E um jovem que tem
dificuldade de fazer as quatro operações matemáticas, por exemplo, tende a não
alcançar salários maiores”, diz a professora.
E o futuro do poder de compra?
O professor
e economista da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da
Universidade de São Paulo (FEA-USP) Paulo Feldmann, acredita que a situação de
renda média pode piorar no futuro. Para ele, o grande vilão do mercado de
trabalho é a inteligência artificial.
Ele acredita
que, a cada ano, as novas tecnologias serão empregadas com mais ímpeto e
“isso tornará cada vez mais desnecessária a mão de obra do brasileiro. Já
que as empresas estão automatizando seus negócios”.
Dessa forma,
nas palavras de Feldmann, “deve haver uma queda no salário médio do
brasileiro”.
Já Carla
Beni, da FGV, ainda vê o horizonte com mais otimismo. Para ela, o jovem que vai
integrar o mercado de trabalho precisa fazer um esforço extra para procurar
capacitação para trabalhar com novas tecnologias, sejam cursos — pagos ou
gratuitos —, aulas extracurriculares ou qualquer tipo de formação específica.
“Há
vagas disponíveis e que pagam bem, mas não há muitos profissionais aptos para
os cargos”, declarou Carla.
Eu perdi poder de compra?
Para que o
brasileiro não perdesse poder de compra, segundo a plataforma de investimentos
Rico, o salário precisaria ter aumentado aproximadamente 88% no período de dez
anos — percentual equivalente ao acumulado do IPCA de 2013 a 2023.
Por exemplo,
quem ganhava R$ 3 mil há 10 anos, precisaria, no ano passado, ter recebido
aproximadamente R$ 5.640,00.
Se o salário
for maior que o resultado da conta, não houve perda no poder de compra.
Se o salário
for menor, o poder foi corroído.
Na prática,
o salário teria quase que dobrar para a pessoa recuperar o poder de compra e
conseguir adquirir a mesma quantidade de itens que em 2013.
Vale
destacar que a mesma conta pode ser feita nos outros anos, basta considerar a
inflação acumulada no período escolhido. Caso queira calcular, o g1 tem uma
calculadora disponível aqui.