Senado argentino rejeita ‘decretaço’ de Milei
Senado argentino rejeita ‘decretaço’ de Milei
Oposição venceu a votação por 42 votos contra 25 e decretou a segunda derrota do presidente no Congresso. Mais cedo, o gabinete da Presidência divulgou um comunicado na rede social X com diversas indiretas à vice-presidente, mas sem citar o nome.
Por g1
O Senado
argentino rejeitou o “decretaço” do presidente Javier Milei nesta
quinta-feira (14), a segunda derrota do governo no Congresso.
Após uma
sessão que durou mais de sete horas e com falas dos senadores, o resultado da
votação foi o seguinte:
42 votos
contrários;
25 votos
favoráveis
4 abstenções
Esta é a
segunda grande derrota do governo de Javier Milei no Congresso argentino. Em
fevereiro, seu partido teve que retirar a lei “ómbinus” de pauta na Câmara
dos Deputados após a rejeição de partes importantes do texto pelos deputados
(leia abaixo qual é a diferença entre a lei “ómnibus” e o
“decretaço”).
Milei não queria que acontecesse a votação do decretaço, convocada pela vice-presidente Victoria Villaruel, que também é presidente do Senado. (Leia mais abaixo)
Agora, o
Decreto Nacional de Urgência (DNU) de Milei, apelidado de
“decretaço”, vai para a Câmara dos Deputados. Para a rejeição total
do “decretaço”, é necessário que ambas as casas do Congresso
argentino o rejeitem. Enquanto isso não acontecer, o DNU continua valendo,
porque funciona a medida provisória.
O presidente
Javier Milei ainda não se pronunciou oficialmente sobre a votação, apenas
repostou mensagens que expõem a votação de cada senador e incluem ataques aos
políticos, em prática similar à que adota em sua rotina.
O porta-voz
da presidência, Manuel Adorni, criticou a decisão do Senado, citando o pouco
tempo que Milei está no poder.
“Pela
primeira vez na história, a decadência e o passado rejeitaram um Decreto de
Necessidade e Urgência (DNU) no Senado da Nação, apenas três meses após o
início do novo governo”, disse Adorni.
“A
sensação é de que perdemos tempo”, disse a senadora de oposição Florencia
López, do Unión por La Pátria, após a votação. Segundo ela, o governo deixou de
tomar outras medidas para conter a inflação e melhorar a situação do país
enquanto gastava energias com o DNU. A inflação no país foi de 13,2% em
fevereiro e chegou a um acumulado de 276,2% em 12 meses.
Votação do DNU no Senado
O Decreto de
Necessidade e Urgência (DNU ou “decretaço”), votado no Senado argentino nesta
quinta-feira (14), uma medida provisória com mais de 600 artigos e diversas
reformas econômicas que flexibiliza o mercado de trabalho e abre caminho a privatizações.
(Leia mais abaixo)
Milei era
contra a votação do “decretaço” no Senado nesta quinta. Isso porque o
decreto vigorará até que seja votado no Legislativo, e avaliação do governo é
que os senadores não o aprovarão. Por isso, o presidente queria prolongar ao
máximo o início da votação da medida provisória.
No entanto,
a vice de Milei, Victoria Villaruel, que também é presidente do Senado, ignorou
os apelos do presidente argentino e colocou a votação em pauta, aumentando as
tensões entre os dois.
Na
quarta-feira (14), em uma publicação na rede social X, sem citar o nome da
vice, o gabinete da Presidência divulgou um comunicado com diversas indiretas à
Villarruel:
“Alguns
setores da classe política pretendem avançar com uma agenda própria e não
consultada” e agradece aos legisladores “que não se prestam ao jogo
perverso daqueles que deliberadamente entorpecem o desenvolvimento da
nação”, disse a nota do governo.
Na Argentina, o vice-presidente concorre na mesma chapa do presidente, como no Brasil, mas lá, uma vez eleito, também assume a função de presidente do Senado. Por isso, Villarruel tem um papel importante na articulação política das votações no Congresso.
Nesta
quinta, o porta-voz da presidência, Manuel Ardoni, negou que o comunicado tenha
sido uma indireta à vice-presidente. “O comunicado é muito firme, mas é
dirigido à toda a classe política. Desconhecemos porque se fez uma leitura
errada como uma mensagem à vice-presidente da nação”, declarou.
A estratégia
de Milei era tentar negociar com os governadores, que têm poder para
influenciar os legisladores, antes de colocar a medida em votação.
Os senadores
de oposição estavam pressionando a Casa para colocar o “decretaço” em
discussão. Villarruel, a vice, até tentou prorrogar discutir a medida por uma
semana, mas ela não conseguiu e a sessão ficou marcada para estar quarta-feira
(14), às 11h de Buenos Aires (é o mesmo horário de Brasília).
Na noite de
quarta-feira, quando se soube que o “decretaço” será pauta do Senado, o governo
divulgou uma nota na rede social X (Twitter) com recados para Villarruel.
Apesar de o
texto não citar o nome dela, há duas citações indiretas:
Logo no começo, fala-se que o gabinete de governo “expressa sua preocupação com a decisão unilateral de alguns setores da classe política que pretendem avançar com uma agenda própria e não consultada”.
Já no
penúltimo parágrafo, afirma-se que “o presidente agradece aos legisladores
comprometidos com os interesses da pátria e com o caminho da mudança e não se
prestam ao jogo perverso daqueles que deliberadamente entorpecem o
desenvolvimento da nação”.
A diferença entre o ‘Decretaço’ e a
lei ‘ómnibus’
Em 20 de
dezembro, poucos dias depois de assumir o cargo de presidente, Milei anunciou o
Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), que viabiliza a desregulação econômica
do país.
O texto
modifica ou revoga mais de 350 normas e está em vigor, embora possa ser derrubado
pelo Congresso.
Entre outros
pontos, o “decretaço”:
– Desregulamenta
o serviço de internet via satélite e a medicina privada;
– Flexibiliza
o mercado de trabalho;
– Altera
regras de locação de imóveis e revoga uma série de leis nacionais;
As medidas incluem também a conversão de diversas empresas estatais em sociedades anônimas, facilitando o processo de privatização dessas instituições.
Uma parte do
“decretaço” que altera normas do direito do trabalho foi derrubada na
Justiça. Houve diversas decisões de primeira instância e pelo menos uma de
segunda instância que determinavam que o governo não poderia alterar regras
trabalhistas no país sem uma lei aprovada pelo Legislativo.
A DNU (ou
“decretaço”) é semelhante ao que no Brasil é conhecido como Medida Provisória:
uma regra que o governo determina e que já passa a vigorar mesmo sem ser votada
pelo Legislativo, mas que deve passar pelos deputados e senadores em algum momento,
e que eles podem derrubar.
Já a lei
“ómnibus” era um projeto de lei que o governo submeteu à aprovação do Congresso
argentino.
Os dois
textos tinham muitos artigos e propunham mudanças muito significativas no país.
O decretaço
abordava mais questões do ordenamento econômico –por exemplo, havia uma reforma
trabalhista, o fim de um Observatório de preços, novas regras para os aluguéis,
abertura de mercado para produtos estrangeiros e privatizações.
O mais
importante da lei “ómnibus” era relativo a uma concentração de poder no próprio
Executivo, que teria mais liberdade para agir durante o governo Milei. O texto,
que foi derrotado, também tratava de termos econômicos, mas eram mais questões
internas de dinheiro dentro do governo –por exemplo, a distribuição do
orçamento entre governo federal e províncias e as aposentadorias que o governo
paga.