Suspeitos de participação na morte da líder quilombola Mãe Bernadete são presos na Bahia
Suspeitos de participação na morte da líder quilombola Mãe Bernadete são presos na Bahia
Idosa, que também é ialorixá, foi assassinada dentro do Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, na noite do dia 17 de agosto.
Por g1 BA
Três homens
foram presos na Bahia pelo envolvimento na morte da líder quilombola e ialorixá
Bernadete Pacífico. O crime aconteceu na noite de 17 de agosto, no Quilombo
Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador.
O anúncio
das prisões foi feito pelo secretário Marcelo Werner, nesta segunda-feira (4),
durante coletiva da Secretaria de Segurança Pública do estado. A delegada-geral
da Polícia Civil, Heloísa Brito, e a diretora-geral do DPT, perita criminal Ana
Cecília Bandeira, também participaram do anúncio.
De acordo
com a SSP, os presos têm diferentes participações no crime:
– Preso
suspeito de ser um dos executores do crime
– Preso por
guardar as armas do crime e preso por porte ilegal de arma de fogo
– Preso pela
receptação dos celulares da líder quilombola e de familiares, roubados durante
o homicídio.
Um dos
envolvidos no crime teve o mandado de prisão cumprido por equipes do
Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), na cidade de Araçás, a
105 km de Salvador, na sexta-feira (1º). Este homem confessou ter sido o
executor do crime.
“Ele
fala o motivo, mas precisamos saber se isso condiz com a verdade. Qualquer
informação passada agora pode não ser a verdade”, disse a delegada-geral.
Ainda na
sexta-feira (1), duas pistolas, que teriam sido utilizadas no homicídio de Mãe
Bernadete, com munições e três carregadores, dois deles estendidos, foram
localizados em uma oficina mecânica na comunidade de Pitanga de Palmares, na
zona rural de Simões Filho, mesma região onde fica o quilombo.
O mecânico
que guardava as armas foi autuado em flagrante por porte ilegal de arma de
fogo. Segundo a SSP, as duas armas apreendidas são compatíveis com os projéteis
recolhidos no local do crime
Já um
terceiro envolvido no crime foi preso no último dia 25 de agosto também em
Simões Filho. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, ele é suspeito
pela receptação dos celulares da líder quilombola e de familiares, roubados
durante o homicídio. Com exceção do homem apontado como executor do crime, já
tinha passagem pela polícia, enquanto os outros dois não têm passagem, e se
forem indiciados, será a primeira vez.
A SSP disse
ainda que segundo as investigações, foi identificado que os envolvidos são
integrantes de um grupo criminoso responsável pelo tráfico de drogas e
homicídios naquela região. Ao menos, um quarto homem, que seria o segundo
executor do crime é procurado pela investigação.
No entanto,
de acordo com o titular da SSP, ainda não é possível confirmar qual a motivação
do crime.
“Em
relação a motivação, nós temos algumas linhas ainda de investigação em
andamento, como eu falei um pouco antes, se a gente antecipar qualquer uma
dessas linhas, pode ser prejudicial, vai ser prejudicial a investigação. Então,
a gente segue as investigações porque existe ainda outras medidas cautelares em
andamento, nós temos inclusive não só equipes trabalhando agora em campo em
busca de outros elementos, de outras pessoas para serem ouvidas também. Temos
recebido também diversas informações através dos denúncias através do 181, que
estão também sendo reportadas à equipe de investigação para apuração, inclusive
a possível identificação, localização do outro executor” disse o
secretário.
Ainda
segundo a Secretaria de Segurança da Bahia foram coletados mais de 60
depoimentos de familiares, testemunhas e outras pessoas. Ações em campo,
alinhadas com atividades de inteligência policial, e uso de recursos
tecnológicos também foram utilizados na investigação. Todo o material
encontrado na cena do crime é periciado pelo Departamento de Polícia Técnica
(DPT).
A Polícia
Civil disse já ter alguns laudos de perícia prontos, mas novos elementos
apresentados serão trabalhados em investigação. Durante a coletiva, a cúpula da
SSP destacou que o Ministério Público, por meio do Grupo de Atuação Especial de
Repressão ao Crime Organizado (GAECO), e o Poder Judiciário da Bahia também
tiveram atuação determinante no caso.
Família da quilombola fará coletiva
Após o
anúncio da Polícia Civil, a família de Bernadete anunciou uma pronunciamento
para a imprensa. O filho de Bernadete, Jurandir Wellington, e o advogado David
Mendez, convocaram uma entrevista coletiva para o final da tarde desta
segunda-feira na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, onde devem
comentar os anúncios feitos no começo da tarde desta segunda-feira.
Poucos dias
após o crime, o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, já havia afirmado que
a Polícia Civil trabalhava com três linhas de investigação para o assassinato
de Bernadete Pacífico.
Na ocasião,
ele afirmou que as hipóteses de briga por território e intolerância religiosa
eram investigadas, mas a mais destacada pela Polícia Civil da Bahia era a de
disputa de facções criminosas – tese que é refutada pela família e pelos
advogados da família de Bernadete.
Subsecretário anunciou identificação
Na última
quinta-feira (31), o subsecretário da Segurança Pública, Marcel de Oliveira,
informou que os suspeitos do crime já haviam sido identificados.
Testemunhas
afirmaram à polícia que o crime foi cometido por dois homens, que entraram no
imóvel usando capacetes, e dispararam contra Mãe Bernadete mais de 10 vezes. No
momento em que os suspeitos invadiram a casa, a líder quilombola assistia
televisão com os netos.
No dia 30 de
agosto, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) informou que o assassinato da líder
quilombola Mãe Bernadete, e do filho dela, ocorrido em 2017, serão acompanhados
pelo Observatório das Causas de Grande Repercussão.
O colegiado
é formado pela entidade e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Ainda na quarta-feira, o advogado David Mendez, que representa a família de Mãe
Bernadete, pediu para ser beneficiado no Programa de Proteção aos Defensores de
Direitos Humanos (PPDDH), do governo federal.
A família da
ialorixá deixou a comunidade quilombola após o crime, por medo, e está sob
proteção da Polícia Militar. Moradores do Quilombo Pitanga dos Palmares estão
assustados com a situação, porque Bernadete era líder do território e gestora
da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq).
Assassinato e investigações
Na noite em
que os homens armados invadiram o local onde estava a líder quilombola, Mãe
Bernadete pensou que os assassinos eram assaltantes.
A informação
foi dada à polícia pelo neto de Bernadete, Wellington Gabriel de Jesus dos
Santos, de 22 anos, que estava com ela na noite do crime. Além dele, estavam
com a ialorixá dois adolescentes de 13 e 12 anos.
Depois de matarem Mãe Bernadete, os suspeitos levaram os celulares da líder quilombola e dos netos. Sem telefone, Wellington utilizou o aplicativo de mensagens que estava aberto no computador, para pedir socorro para pessoas que vivem no quilombo.
Depois
disso, ele deixou os familiares adolescentes com um vizinho e foi até o
terreiro de candomblé, que fica dentro do Pitanga dos Palmares, para ligar para
a polícia. Os suspeitos chegaram e saíram do quilombo de moto.
Medo e ameaças
Familiares
relataram que Mãe Bernadete sofria ameaças havia pelo menos dois meses. Ela
falou publicamente a respeito durante um encontro com a presidente do Supremo
Tribunal Federal, Rosa Weber, em julho deste ano.
À polícia,
Wellington relatou que não se lembra de ver a avó ser ameaçada, nem de ter
inimizades. Apesar disso, ele contou que Mãe Bernadete passou a ter
“muitos medos” após a morte de Flávio Gabriel Pacifico dos Santos,
conhecido como “Binho do Quilombo”, em 2017.
Binho era
filho de Bernadete e pai de Wellington. Assim como a mãe, ele morreu após ser
baleado com diversos tiros dentro do quilombo. Seis anos após o crime, ninguém
foi preso. Nesta segunda-feira (4), a delega-geral da Polícia Civil disse que
ainda não é possível relacionar a morte da ialorixá com o crime de Binho.
Segundo o
Governo da Bahia, a líder quilombola passou a fazer parte do Programa de
Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal, por
meio da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos da Bahia, após o assassinato
do filho.
Familiares,
no entanto, dizem que ela estava sob proteção da Polícia Militar há pelo menos
dois anos. Mesmo dentro do programa, com rondas e câmeras instaladas no
quilombo, a líder foi morta.