Todo o futebol brasileiro deveria se preocupar com a derrota do Botafogo no Catar
Todo o futebol brasileiro deveria se preocupar com a derrota do Botafogo no Catar
Por GE
É natural
que a rivalidade faça com que torcedores rivais se divirtam com derrotas como a
que o Botafogo sofreu diante do Pachuca. Mas analisando mais profundamente o
que aconteceu no Catar, ou mesmo nos dias e semanas prévios à viagem alvinegra
para a Copa Intercontinental, o mais adequado seria dizer que qualquer torcedor
brasileiro deveria se preocupar. Porque a maratona que contribuiu para que o
Botafogo sucumbisse contra os mexicanos, em breve pode vitimar qualquer outro
clube do país. A derrota escancara alguns dos mais graves problemas estruturais
do futebol brasileiro.
Foi
impossível olhar para o jogo e não pensar no calendário nacional. Se o Pachuca
era um adversário pouco habitual de um clube brasileiro, a maratona a que times
do pais são submetidos antes de jogar algumas partidas de futebol não é. E o
alvinegro foi a vítima da vez: a final da Libertadores, o jogo decisivo com o
Internacional, o título brasileiro contra o São Paulo há três dias, as 15 horas
de viagem, as noites mal dormidas, o fuso horário… Nada disso combina com uma
preparação desejável para competir em alto nível.
O impacto do
desgaste se revelou mais na forma como o Botafogo sucumbiu do que propriamente
no fato de um time brasileiro não avançar numa competição com os campeões de
outros continentes. Porque aí entra outro ponto importante a analisar. Este
tipo de torneio, com formato similar ao que a Fifa adotava em seu Mundial de
Clubes até o ano passado, termina por nos confrontar com uma dura realidade: os
melhores times da América do Sul estão muito mais próximos dos campeões dos
demais continentes do que dos campeões europeus.
Então,
assistir a uma eliminação do vencedor da Libertadores diante de um
representante das Américas do Norte ou Central, ou mesmo contra um asiático ou
africano, já não deveria chocar. Desde 2012, quando o Corinthians bateu o
Chelsea no último título mundial da América do Sul, os campeões da Libertadores
não chegaram à final contra o Europeu em seis edições, ou seja, exatamente a
metade das disputas desde então.
O fato é
que, se a globalização concentra riqueza na Europa, tira do Brasil as grandes
estrelas e aproxima as forças na periferia, também é verdade que o calendário
brasileiro não ajuda os clubes daqui para enfrentamentos cada vez mais
parelhos. Já é possível prever novos problemas em 2025.
O calendário
do ano que vem, desta vez discutido com os clubes, tem avanços. Antecipar para
março o início do Brasileiro e empurrar parte dos Estaduais para o período da
pré-temporada são acertos. No entanto, são as melhores e mais criativas
soluções possíveis dentro de uma estrutura política que segue impondo as 16
datas dos Estaduais e um total de quase 80 compromissos às equipes brasileiras
mais bem-sucedidas. Na quarta-feira, em Doha, um Botafogo com 75 jogos no ano
enfrentava um Pachuca que fazia sua 49ª partida em 2024.
A
necessidade de encaixar tantos jogos já criou um período delicado para junho de
2025, às vésperas do novo Mundial de Clubes, nos EUA. Há uma Data-Fifa
inconveniente, marcada pela entidade internacional, terminando no dia 10, com
um Brasil x Paraguai pelas eliminatórias. No dia 12, uma quinta-feira, há uma
rodada do Campeonato Brasileiro e, três dias mais tarde, Botafogo e Palmeiras
estreiam no Mundial. Ou seja, será preciso remanejar jogos da rodada do
Brasileiro para uma Data-Fifa, ou submeter estes clubes a uma maratona similar
à que fez o Botafogo: jogar no Brasil, fazer uma longa viagem e entrar em campo
com pouquíssimo descanso para estrear no Mundial.
O novo
torneio impõe outro risco, assumido em conjunto por CBF e clubes: há rodada do
Brasileirão marcada para o dia da final do Mundial de Clubes. Ou seja, se um
clube do país conseguir o feito de chegar à decisão, terá que adiar seu jogo
pelo campeonato nacional.
Para que o calendário tenha um recesso no meio do ano, durante o Mundial da Fifa, o Brasileirão terá que avançar até o dia 21 de dezembro – uma estrutura que a CBF pretende manter pelas próximas temporadas. Óbvio que é melhor parar o futebol doméstico durante os torneios internacionais de meio de ano. No entanto, como se joga um número absurdo de partidas no Brasil, outros problemas se criam. A Copa Intercontinental de 2025, caso aconteça, irá coincidir com algumas das seis rodadas do Campeonato Brasileiro previstas para dezembro.
A derrota
para o Pachuca encerra uma grande temporada do Botafogo, a maior da história do
clube. O alvinegro, além de oferecer ao país o melhor futebol jogado neste ano,
também nos deu motivos para refletir. O futebol brasileiro precisa partir de
vez para uma reforma estrutural. É possível obter avanços no calendário, mas o
mundo ideal só será alcançado quando CBF e clubes romperem com uma estrutura
política arcaica que sustenta Estaduais longos e impõe uma maratona desumana a
times e jogadores. Isto se o futebol brasileiro quiser ajudar seus clubes a
serem mais competitivos no cenário de um futebol global cada vez mais
competitivo.