Veja o que o hacker Walter Delgatti afirmou em depoimento à CPI dos Atos Golpistas
Veja o que o hacker Walter Delgatti afirmou em depoimento à CPI dos Atos Golpistas
Preso por invasão a sistemas do Conselho Nacional de Justiça, 'hacker da Vaza Jato' disse que Bolsonaro prometeu a ele um indulto caso fosse preso por ação contra urnas.
Por g1 — Brasília
O hacker
Walter Delgatti prestou depoimento à CPI dos Atos Golpistas nesta quinta-feira
(17) no Congresso Nacional. Ele começou a depor por volta de 9h40 e a
participação de Delgatti ainda não havia terminado até a última atualização
desta reportagem.
Preso desde
o dia 2 de agosto por invasão a sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
Delgatti ficou conhecido nacionalmente em 2019, quando vazou mensagens de
diversas autoridades envolvidas na operação Lava Jato. O episódio, investigado
na operação Spoofing, ficou conhecido como “Vaza Jato”.
Ele foi
convocado para comparecer à CPI dos Atos Golpistas após uma operação da Polícia
Federal, que também mirou a deputada bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP). Os
agentes da PF apuram a inserção de alvarás de soltura e mandados de prisão
falsos no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões, do CNJ.
Aos
investigadores, Delgatti disse que Bolsonaro teria questionado a ele sobre
possibilidade de invasão às urnas eletrônicas.
À CPI nesta
quinta-feira, Delgatti afirmou que:
– Bolsonaro
prometeu a ele um indulto caso fosse preso por ação contra urnas eletrônicas
– o
ex-presidente citou um ‘grampo’ contra Moraes e pediu a Delgatti que ‘assumisse
autoria’ da invasão
– a deputada
Zambelli prometeu a ele emprego na campanha de Bolsonaro de 2022
– o
marqueteiro de Bolsonaro na campanha pediu um ‘código-fonte’ fake para apontar
fragilidade nas urnas
– sabia que
estava cometendo crime ao agir contra as urnas, mas que havia recebido ordem do
então presidente
– Zambelli
enviou a ele o texto de um falso mandado de prisão contra Moraes
– orientou
servidores do Ministério da Defesa na elaboração de relatório sobre urnas
– Moro é um
‘criminoso contumaz’ e bateu boca com o ex-juiz da Lava Jato, que chamou o
hacker de ‘bandido’
Promessa de indulto
Delgatti
afirmou aos integrantes da CPI que, durante uma reunião no Palácio da Alvorada
com Jair Bolsonaro (PL) antes das eleições de 2022, o então presidente
assegurou que concederia um indulto (perdão presidencial) a ele, caso fosse
preso ou condenado por ações sobre urnas eletrônicas.
Questionado
pela relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), se recebeu garantia
de proteção do ex-presidente, Delgatti confirmou.
“A
ideia ali era que eu receberia um indulto do presidente. Ele havia concedido um
indulto a um deputado federal. E como eu estava com o processo da Spoofing à
época, e com as cautelares que me proibiam de acessar a internet e trabalhar,
eu visava a esse indulto. E foi oferecido no dia”, declarou.
Grampo contra Moraes
No
depoimento, o “hacker da Vaza Jato” disse que, em conversa com
Bolsonaro, ouviu que o entorno do então presidente já havia conseguido grampear
o ministro Alexandre de Moraes, integrante do Supremo Tribunal Federal e
presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo
Delgatti, na ligação, Bolsonaro teria sugerido que Delgatti Neto “assumisse
a autoria” do grampo.
“Segundo
ele [Bolsonaro], eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à
época, do ministro Alexandre de Moraes. Que teria conversas comprometedoras do
ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo”, disse.
Ainda de
acordo com o hacker, a ideia por trás dessa estratégia era evitar
questionamentos “da esquerda” – já que, por ter hackeado autoridades
ligadas à operação Lava Jato, em anos anteriores, ele gozaria de prestígio
entre os opositores de Bolsonaro.
Emprego na campanha de Bolsonaro
O hacker
também afirmou que a deputada Carla Zambelli teria prometido a ele um emprego
na campanha à reeleição do candidato Jair Bolsonaro.
No entanto,
segundo Delgatti, a proposta não avançou e ele ficou encarregado de cuidar das
redes sociais da parlamentar.
Delgatti
afirmou que se encontrou por acaso com Zambelli em Ribeirão Preto (SP) e se
apresentou. Os dois então teriam trocado contato e, segundo o hacker, a
deputada o contatou e ofereceu uma vaga de trabalho.
“Ela
[Zambelli] disse que havia uma oportunidade de emprego para mim, no caso, seria
na campanha do Jair Bolsonaro, do ex-presidente”, declarou.
‘Código-fonte’ fake das urnas
Segundo o
hacker, em uma reunião com assessores de campanha de Jair Bolsonaro, ele foi
aconselhado a criar um “código-fonte” falso para sugerir que a urna
eletrônica era vulnerável e passível de fraude.
A proposta
teria partido do marqueteiro Duda Lima em uma reunião com o presidente do PL,
Valdemar Costa Neto, a deputada Carla Zambelli (PL-SP) e outras pessoas ligadas
à parlamentar.
“A
segunda ideia era no dia 7 de setembro, eles pegarem uma urna emprestada da
OAB, acredito. E que eu colocasse um aplicativo meu lá e mostrasse à população
que é possível apertar um voto e sair outro”, disse Delgatti.
“Eles
queriam que eu fizesse um código-fonte meu, não o oficial do TSE. E nesse
código-fonte, eu inserisse essas linhas, que eles chamam de ‘código malicioso’,
porque tem como finalidade enganar, colocar dúvidas na eleição”, completou
Delgatti.
‘Ordem do presidente’
Delgatti
afirmou que sabia que estava cometendo crime ao atuar contra o processo
eleitoral, mas que agiu por suposta “ordem de um presidente da
República”.
“Sim,
eu sabia [que estava fazendo coisas erradas]. Lembrando que era ordem de um
presidente da República. […] Então, eu estava… tanto que eu entrei em
contato com a ‘Veja’ e relatei isso por medo”.
Ele disse
que o medo decorria do fato de saber que estava cometendo crime. E voltou a
dizer que Bolsonaro teria garantido “indulto em uma eventual investigação,
uma eventual denúncia, ou processo ou condenação”.
Mandado falso contra Moraes
Delgatti voltou a dizer que partiu de Carla Zambelli o texto de um falso mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes.
O falso
mandado foi inserido no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) e descoberto em 5 de janeiro.
“Fui eu
[o responsável por inserir o mandado falso no sistema]. A deputada me enviou um
texto pronto, eu corrigi alguns erros e contextualizei, e publiquei a decisão.
Ela me enviou [o texto], quem fez eu não sei”, declarou.
Relatório sobre urnas
Delgatti
disse que orientou técnicos do Ministério da Defesa que elaboraram relatório
oficial da pasta sobre as urnas eletrônicas. O documento, posteriormente, foi
entregue ao TSE, em novembro de 2022.
O relatório
não apontou qualquer fraude na votação, mas pediu que o TSE fizesse
“ajustes” no sistema eleitoral já rejeitados tecnicamente por
entidades fiscalizadoras e disse que não era possível atestar a
“isenção” das urnas.
A posição do
Ministério da Defesa, sugerindo dúvidas sobre a isenção das urnas, divergiu de
todas as demais entidades fiscalizadoras nacionais e internacionais.
“Tudo
isso que eu repassei a eles consta no relatório que foi entregue ao TSE. Eu
posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que
eu disse, não tem nada menos e nada mais”, afirmou o hacker.
Bate-boca com Moro
Durante o
depoimento, o hacker Walter Delgatti e o senador Sergio Moro (União Brasil-PR)
bateram boca. O hacker, que prestava depoimento, afirmou que Moro é
“criminoso contumaz” e foi chamado pelo ex-juiz de
“bandido”.
Delgatti
Neto ficou conhecido como o hacker da “Vaza Jato”, em 2019, quando
invadiu dispositivos eletrônicos e vazou mensagens atribuídas ao então ministro
da Justiça e ex-juiz Sergio Moro, a integrantes da força-tarefa da Lava Jato e
a outras autoridades.
O embate
iniciou quando Moro citou condenação de Delgatti pelo crime de estelionato,
relacionado a golpes que teriam sido cometidos em Araraquara (SP), e perguntou
ao hacker quantas vítimas ele teria prejudicado. Delgatti respondeu:
“Relembrando
que eu fui vítima de uma perseguição em Araraquara, inclusive, equiparada à
perseguição que vossa excelência fez com o presidente Lula e integrantes do
PT”.
Na
sequência, Delgatti disse que leu conversas do ex-juiz da Lava Jato em
aplicativos de mensagem. “Li a parte privada e posso dizer que o senhor é
um criminoso contumaz, cometeu diversas irregularidades e crimes”.
Moro, então,
pediu ao vice-presidente da CPI, senador Cid Gomes (PDT-CE), que exercia a
presidência da comissão, que advertisse Delgatti, dizendo que o depoente não
podia caluniar um senador na CPI.
“Bandido
aqui, desculpe senhor Walter, que foi preso é o senhor. O senhor foi condenado.
O senhor é inocente como o presidente Lula, então?”, indagou o senador.
“O
senhor não foi preso porque recorreu à prerrogativa de foro por função”,
retrucou o hacker.
O que dizem os citados por Delgatti
Em nota, a
defesa da deputada Carla Zambelli (PL-SP) “refuta e rechaça qualquer
acusação de prática de condutas ilícitas e ou imorais pela parlamentar”. E
diz que não teve acesso aos autos da investigação.
“Suas
versões [de Delgatti] mudam com os dias, suas distorções e invenções são
recheadas de mentiras, bastando notar que a cada versão, ele modifica os fatos,
o que é só mais um sintoma de que a sua palavra é totalmente despida de
idoneidade e credibilidade”, diz a defesa da deputada.